quarta-feira, junho 13, 2007

Pierrot

Acabou. Terminou de vez. Já se passava da meia-noite quando após horas a fio de estudo improdutivo tomei a decisão de dar um fim no meu sofrimento.

Após receber mais uma negativa para algum pequeno compromisso que seja, uma peça de teatro, um cineminha ao fim da semana, um petisco qualquer na esquina do supermercado.

Nada, todos negados.

Ela afirma ser por causas superiores, vontades alheias as dela, mas eu não consigo admitir. Como assim. Como após meses de amor intenso tudo pode ser apagar de uma hora para outra, como tudo aquilo de bom que havíamos construído evaporou da mente dela como água em ebulição fervorosa.

Eu sofro. Na kitnet apertada, tocando músicas tristes e melancólicas na velha viola de família, com o copo ao lado cheirando a fumaça, tentando esquecê-la; eu sofro.

Paro pra pensar: Diabos, que assunto mais clichê, sofrer de amor!

Eu deveria estar por aí, na farra, como fazem os jovens de hoje em dia. Muita bebedeira, curtição e agarração sem compromisso nenhum, gozando do imaculado livre arbítrio da juventude.

Confesso que já tentei. Já tive outras mulheres além dela.

Aquelas que chamam de mulheres "fast-food".

Mas mesmo acordando no dia seguinte ao lado de um fenômeno da natureza - belas curvas, belos músculos, belos cabelos; e mesmo após adentrar e preencher com voracidade a alma e corpo de outrem durante a noite; eu acordo vazio. Triste, melancólico como uma caminhada numa praia a mercê de densa neblina.

Por que meu Deus?! Por quê?!

Por que os seres-humanos, famosos por tanta racionalidade e inteligência, sofrem desse mal burro, egoísta e teimoso com a alcunha de amor?!

"É o que dá graça à vida!" – diria algum bonvivant que também, no fundo de um coração malandro, já sofreu por alguém por culpa do amor.

Pois se é pra dar graça à vida, obrigado; essa graça eu não quero não senhor.

Mas... oh sim!

Não nos esqueçamos da sublime fase enquanto o amor é concreto, palpável, compartilhável entre duas partes.

Juras eternas, abraços infinitos, beijos eloqüentes!

Como é bom amar e ser amado.

Viver e compartilhar.

Ser egoísta de querer possuir um ser tão insignificante para a grandeza do universo só para si.

E mesmo assim nós juramos: "Te amo! Do tamanho de mil universos inteiros, meu amor!"

Como o amor é bobo, mimado, dengoso e superprotegido.

Quando se está amando é só ele que importa! AMOR, eu e nada mais!

Assim fica fácil entender a dor aguda no peito, a angústia na boca do estômago, as tremedeiras de choro na cama de madrugada durante uma data especial quando tudo se acaba.

O mundo desaba, o chão desaparece, as paredes se tornam pequenos caixotes; você pensa que vai morrer ali mesmo, no mesmo quarto que já presenciou as mais irrefutáveis provas de amor...

Pior é quando, como se não bastasse somente essa dor alucinante, vem o dito arrependimento.

Palavra que deveria ser suprimida do dicionário, da vida, da terra, do universo.

Melhor é ser abandonado do que abandonar um grande amor e depois se arrepender profundamente.

Ficar pensando se não já havia encontrado a alma gêmea, a metade da laranja, o amigo-do-lado-esquerdo-do-peito, a mulher, a companheira, a mãe, a vó, enfim...

Encontrou e deixou escapar por entre os rudes e insensíveis dedos que não souberam apreciar a maciez da pessoa que ofereceu "todo o amor desse mundo" só e somente para você.

Dói, dói muito.

E eu não desejo isso pra ninguém.

Nem mesmo para o Bush ou para o Lula.

domingo, maio 20, 2007

O Escrivão

Monitor, teclado, mouse. Tudo aquilo estava a sua frente e ele não conseguia escrever nada. Nem ao menos olhava para a tela do monitor para ver o que estava escrevendo. “Ninguém vai ler mesmo, então não importa se eu escrever errado” – pensava.

Ele precisava escrever, mas não sabia o porquê. Ultimamente vinha tendo essa vontade. Sempre que ele via postagens em flogs e blogs dizendo , após um longo texto, que escritor agora estava bem melhor após todas as injúrias e raivas postas para fora em simples bytes de palavras, sentia necessidade de escrever também. Ele queria desabafar, escrever tudo aquilo que estava preso em seu peito mas que ele não podia, ou não conseguia, dizer para ninguém mais.

Meia hora depois ele continua na primeira linha; já havia escrito um parágrafo inteiro, porém achou ruim e apagou: “Quisera eu ter prestado atenção às aulas de redação...”. Sua criatividade também não andava lá essas coisas. Ele só queria entender por que sentia aquela sutil depressão que teimava em continuar no seu peito, esmagando seu coração e sua alma aos poucos. Afinal, ele tinha uma vida ótima; estudava, tinha já um estágio, possuía dinheiro suficiente para se divertir com os amigos, havia também seus amigos que ele pensava ser bons amigos. Contudo ele sabia que de nada adiantava tentar camuflar sua tristeza ocupando a cabeça com os amigos, com os estudos ou até mesmo com a bebida nos fins-de-semana.

Ele precisava escrever. Quem sabe escrevendo não encontrava a resposta para a sua ansiedade, quem sabe talvez até não conseguiria ir apagando sua tristeza ao escrever para um computador mudo e sem reação.

Já se foram dois parágrafos; “Acho que peguei o ritmo...”, ele pensa sem muita felicidade. O processo é doloroso e massacrante; quanto mais escreve, mais a dor miúda no peito vai aumentando de intensidade. É como limpar um corte profundo, dói muito, muito mesmo, mas é necessário para a saúde mental e emocional.

Já podendo notar pingos de suas lágrimas na mesa ele não parou; não agora, não quando ele finalmente conseguiu transpor a barreira e entrar no super-protegido mundo povoado pelos seus traumas e por suas fraquezas. Ele queria de qualquer forma entender essa alucinante dor em sua alma.

Ficou escrevendo por toda a madrugada e decidiu que não iria para a faculdade naquela manhã e nem ao estágio pela tarde. Queria dormir profundamente pra quem sabe escrever mais na noite seguinte.

Dormiu por horas e acordou atordoado. Após o sonho que parece que durou infinitas horas ele agora sabe aquilo o qual lhe causa toda essa angústia.

Liga o monitor, abre o editor de texto. Sente as lágrimas secas nas teclas. Está decidido a escrever ferozmente.

Vai escrever sobre o que domina sua alma e seu mundo...

Escreverá sobre ela.

terça-feira, maio 08, 2007

8

Vi um mendigo pedindo esmolas.
- Qual seu nome? - perguntei.
- Não lembro.
- Como alguém pode esquecer o próprio nome?
- Isso não é nada. Pior são as pessoas, que
passam por mim e esquecem que sou gente.

BOTTER, Nelson. 'Distraídos' (www.blonicas.zip.net)

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